domingo, 6 de setembro de 2009

Dono do Mastruz desabafa em entrevista e diz que pirataria o "afundou". Confira detalhes


Em entrevista inédita, o maior empresário de Forró do planeta, o senhorito "Barbudo" Emanuel Gurgel afirmou que ninguém no mundo levou maior cacetada da pirataria do que ele.

Ele também revelou diversas informações, algumas desconhecidas do público forrozeiro.

Para quem gosta de forró, a leitura desta entrevista torna-se obrigatória, pois revela as dificuldades do empresário lá na década de 90, para lançar o forró eletrônico para todo o Brasil.

Quem ler, com certeza, vai ficar de "boca aberta" com as palavras deste "senhorito único do forró".

Os forrozeiros em geral, tem que aplaudi-lo de pé, pois foi o maior responsável pelo ritmo forrozeiro que curtimos atualmente.

Fonte: Jornal o Povo


Por: (Dalviane Pires)
Foi com Emanuel Gurgel que o forró virou um negócio grande no Ceará. Ao O POVO, o empresário que tem seus métodos copiados até hoje, fala sobre a trajetória de sucesso

A reportagem foi recebida na fazenda onde mora, a Ingá, em São Gonçalo do Amarante. Chegamos na companhia da filha Rebeca, 21, que a todo instante se derretia de afetos ao pai. Foi em seu escritório, improvisado em uma ventilada varanda com vistas para açudes e sertão, que entre um cigarro e outro o empresário Emanuel Gurgel recordou o tempo em que revolucionou a forma de fazer forró no País.


O POVO - Como o senhor percebeu que forró poderia dar dinheiro?
Emanuel Gurgel - Existem dois tipos de economia: a intuitiva e a científica. A intuitiva diz que você tem uma ideia e acredita nela. Tenho uma filosofia que é um negócio chamado sacada. Você tem que ter a sacada na frente. Eu gostava de ir pra festa dançar.

Na época tinha uma banda chamada Black Banda. Toda vida, quando faltava meia hora para o intervalo, a banda começava a tocar forró. O salão ficava lotado. E eu só gostava de dançar forró. Então eu ficava preso numa festa durante umas cinco horas, para dançar poucas músicas. Fiz amizade com o pessoal da banda, fiquei sócio deles. Banquei o disco.

Pra você ter uma ideia, quem tocava sanfona há 20 anos atrás era o pedinte, o cego que ia nas feiras. Hoje você não vê mais pedinte tocando sanfona. Todos hoje estão tocando nas bandas de forró.

O POVO - Conseguiu que a banda passasse a tocar só forró? Gurgel - Foi feita uma reunião com eles e a segunda filosofia que coloquei é que como eles eram de uma banda estourada, não podiam vender as datas.

Que as datas tinham que ser bancadas. Festas bancadas é quando você é sócio e a cada festa eu era sócio.

O POVO - Não fechava um cachê...
Gurgel - Isso. Mastruz com Leite, por exemplo, eu não vendia por preço nenhum. E hoje, 20 anos depois, as bandas copiam a ideia. Antes artista nenhum no mundo fazia isso.

Por que? Porque o artista é artista, não é comerciante. E eu como não sou artista...

O POVO - Mas como foi o momento da “sacada”, como o senhor diz?
Gurgel - Aí volto à economia científica e intuitiva. Uma depende muito da outra, mas a intuição é muito mais forte. Uma grande ideia revoluciona tudo.

O POVO - Verdade. Mas vamos voltar para a Black Banda...
Gurgel - Sim...a Black Banda simplesmente não quis tocar só forró. Eu dizia “rapaz nós temos que sair do Ceará.

Vai ter uma hora que vocês vão cansar e quando cansarem não vão ter mercado além das fronteiras”. E eles não acreditavam.

O POVO - Foi aí que surgiu a sacada de montar a própria banda?
Gurgel - Como eu notei que o salão ficava lotado, pensei: rapaz, se botar uma banda tocando só forró, o salão vai ficar o tempo todo lotado.

Era a lógica. O que as pessoas mais reclamavam? Do intervalo musical. Uma hora da manhã parava e ficava até uma e meia, os músicos ficavam cozinhando... Daí montei uma banda chamada Aquarius, mas como peguei músicos da mesma filosofia da Black Banda, não deu certo.

O POVO - E o que o senhor fez?
Gurgel - Resolvi montar uma banda que não tivesse vergonha. Ah, outra marca do Emanuel Gurgel foi dizer no meio da música a vinheta “É o forró Mastruz com Leite”.

O POVO - E isso pegou também nas outras bandas... Gurgel - Todas as bandas hoje fazem, anunciam. Só uma pessoa no mundo sacou isso. O Mansueto Barbosa, já falecido, um dia me chamou na sala dele e disse: “vou cobrar pra cobrar sua música! Você colocou uma vinheta na sua música. Está vendendo um comercial”. Música é um produto em uma prateleira de consumo. E ou dá certo ou não dá certo.

O POVO - E deu... Gurgel - Na época o sonho de todo artista era gravar pela Continental. Nós conseguimos o contato.

Antes, gravamos o primeiro CD em um estúdio do meu amigo Marcílio, um dos homens mais sérios que eu conheço no mundo da música, que não costuma ter muita gente séria.

O índice de safadeza na música é parecido com o Senado, com as devidas proporções. Fomos gravar e não tinha repertório.

Conseguimos só duas músicas inéditas. Quando veio a fita cassete para eu tirar a prova, o Marcílio tinha tirado todas as assinaturas “É o forró Mastruz com Leite”.

Liguei para o Marcílio e disse “você gravou o maior sucesso da vida do seu estúdio”. Ele começou a rir e eu continuei: “dez horas da noite vai tá todo mundo aí para colocar tudo que você apagou”. Terminamos quase cinco horas da manhã achando o ponto certo.

O POVO - E a Continental aprovou?
Gurgel - E prometeu que o Mastruz e ia tocar na Globo, no Rio...Começaram a vender, vender e como eu era marinheiro de primeira viagem acreditei que o mundo da música era igual ao mundo que eu conhecia, de comerciante sério.

Mas era só promessa. Queriam só vender o disco do Mastruz e bye, bye Brasil.

O POVO - E foi aí que surgiu a ideia de criar a SomZoom?
Gurgel - Na época ninguém no Ceará tinha som de qualidade. Todos os sons eram ridículos. Chamei o Trigueiro Neto, do Rio Grande do Norte e disse: “Trigueiro vamos montar um estúdio. Quanto custa?”. Ele disse que era 150 mil dólares. Tudo era dolarizado.Disseram que nunca na vida eu ia ver o retorno desse dinheiro.

O POVO - Mais uma vez a intuição?
Gurgel - A intuição. Quando montei o estúdio, nunca aceitei que o cara gravasse e pagasse as horas. O cara que gravava, eu tinha que ser sócio da gravação dele. Por isso surgiu um monte de banda.s.

Eu dava estúdio, a gravação e a ideia. Não existe ninguém do planeta terra pra ter levado cacetada maior da pirataria do que eu. De 520 funcionários a SomZoom tem hoje uns 150.

O POVO - Com o estúdio o Mastruz com Leite estourou mais ainda...
Gurgel - A primeira gravação do estúdio foi logo uma cacetada: “Meu vaqueiro, meu peão”. Daí resolvi gravar os próprios CDs, montar uma gravadora, a SomZoom.

O POVO - Resolveu também a questão dos intervalos na festa?
Gurgel - Começamos a tocar cinco horas seguidas. Coloquei dois bateristas, dois sanfoneiros...Como eram muitos shows, acabei ficando preso na minha própria armação.

Depois tirei o show pra duas horas e criei uma outra banda. Aí Matruz tocava duas horas e outra banda entrava e Mastruz ia pra outro canto.

Quatro, cinco bandas em festa foi ideia minha. A SomZom chegou a ter 11 bandas e 160 músicos. Daí eu comecei a sair do Estado com o Mastruz.

No começo essas bandas cobriam o prejuízo do Mastruz fora. Mastruz fez show para 11 pessoas em Recife.

O POVO - Não eram conhecidos?
Gurgel - Não. Ia, levava o disco e fazia promoção com rádios em uma figura conhecida chamada “jabá”. Conhece “jabá”?

O POVO - Conheço, mas não gosto... Gurgel - Pois eu gosto. Dentro do feijão. Fora isso, sofri muito com ele. Quando deixava em Recife começa a tocar e quando eu dava as costas não tocavam mais.

Então a ideia era fazer um negócio que ninguém metesse a mão. Uma rede de rádio. Voltando ao objetivo de que música é um comércio, mandava sinal pras rádios no interior e pagava um tanto para a energia.

Ora, o cara não ia gastar funcionário naquele horário, ia ter boa programação e ainda ia ter o dinheiro para pagar a energia...E é por isso que a SomZoom Sat ainda dá tanto certo.

O POVO - Então com a rádio o forró foi pra outros estados?
Gurgel - Empurramos goela adentro.

O POVO - Como nasce um sucesso?
Gurgel - É quando a música vem do povo pra rádio. Você começa a escutar, depois chega na casa de show, depois na rádio, aí não tem no mundo quem segure esse sucesso.

O POVO - Mas como chega na nossa casa sem passar pela rádio? Gurgel - Uma pessoa faz uma banda, coloca músicas boas, aí faz um CD e entrega pra você, depois uma amiga escuta e tira uma cópia e aí vai.

Leva um tempo? Leva. Quando o sucesso é no rádio você vai no atacado.

Aqui você vai no varejo e picotado, mas é mais consistente. Hoje a distribuição é no CD, antes era da fita cassete.

O POVO - E como que se identifica uma banda que vai fazer sucesso?
Gurgel - Aí só Jesus Cristo. O que acontece é que muita gente monta uma banda, mas esquece que está montando um negócio. 90% dessas bandas que nascem e morrem no outro dia funcionam assim.

Acham que o Emanuel Gurgel ganhou muito dinheiro, ficou rico e não sabem que eu já vivia muito bem antes de ter bandas de forró.

O POVO - Mas explique melhor...
Gurgel - Só existe um jeito de você assumir uma banda de forró para fazer sucesso: é você ter dinheiro para bancar.

O POVO - E o senhor ainda é muito procurado para bancar bandas?
Gurgel - Muito. Até para dar entrevistas. (risos)

Nenhum comentário:

Postar um comentário